segunda-feira, 29 de julho de 2013

Caricatura de um "Mundo Ateu" segundo a visão torta de um crente acéfalo


Em minhas prospecções pelo Youtube, encontrei um vídeo intitulado "Um Mundo Ateu". É um vídeo que apresenta uma caricatura do que seria, segundo a visão de um fundamentalista cristão, um mundo dominado por pessoas racionais, desprovidas de crenças em mitologias ancestrais. Como não poderia deixar de ser, o vídeo é um desfile de mentiras, distorções e falácias. Há predominância de imagens sombrias para ilustrar um texto eivado de preconceitos e "chutes". Não dá para levar a sério um vídeo que, na verdade, é um exercício ficcional que tem o intuito de levantar a bola do fundamentalismo religioso em detrimento de um mundo mais racional. Mas vale a pena conferir, nem que seja para ver onde chega o "talento" de alguns fundamentalistas de orientação cristã.

O vídeo é uma palhaçada. Começa com um exercício de imaginação que só pode passar pela cabeça podre de um fundamentalista quando expõe a seguinte frase: "Imagine um futuro distante onde o cristianismo foi esquecido e o mundo ignorou há muito a verdadeira moral que emana de Deus..." Ridículo. A "verdadeira moral" que emana desse deusinho podre referido pelo vídeo inclui apedrejar pessoas por adultério, matar sumariamente pessoas apóstatas, punição severa para pessoas que violem o "sábado sagrado" e outras barbaridades advindas de uma "moral absoluta". A verdadeira moral evolui junto com a sociedade. Na Idade Média, instituições religiosas consideravam moralmente correto matar pessoas na fogueira como punição para o que consideravam crimes. Hoje em dia, nenhuma instituição religiosa séria cogita em aplicar pena de morte a pessoas que desafiem seus dogmas. A moral humanista é infinitamente superior a essa "moral" assassina das doutrinas religiosas, principalmente da cristã.

Certamente uma pessoa civilizada e em sã consciência nem hesitaria em condenar a prática da escravidão. Mas, segundo a bíblia, é uma prática moralmente aceita. O personagem Jesus Cristo fez apologia da tortura de escravos na seguinte passagem: "Aquele servo (escravo) que sabia a vontade de seu senhor e não se preparou, nem fez segundo a sua vontade, será punido com muitos açoites". (Lucas 12:47). Jesus NUNCA admoestou a prática da escravidão, utilizando-se da relação senhor-escravo em muitas de suas parábolas. Uma das coisas que realmente ajudou a acabar com a escravidão foi a filosofia humanista que influenciou os ideais da revolução francesa, incorporando bandeiras como a liberdade, a igualdade e a fraternidade. A verdadeira moral evoluiu através de discussões racionais baseadas na empatia (um sentimento que é uma conquista da civilização) e na filosofia de orientação humanista e secular. Se dependêssemos da "moral religiosa" provavelmente ainda estaríamos na Idade das Trevas.

Em seguida, o texto idiota do vídeo tenta rebaixar a visão de mundo desprovida de crenças em divindades à condição da imbecilidade da fé. É óbvio que a fé é algo obsoleto para a ciência, onde o que importa são as evidências, mas um fundamentalista não possui inteligência ou honestidade intelectual para entender isso. Há um excelente texto de Richard Dawkins intitulado "A Ciência é uma Religião?" que joga luz sobre esse assunto. Para completar a caricatura, o crente que fez o vídeo ainda coloca a imagem de uma paisagem na penumbra, uma imagem sombria, que transmite a ideia de que pessoas desprovidas de fé em seres improváveis vivem "nas trevas". É exatamente isso que transmite o subtexto dessa passagem desse vídeo. Nessa mesma passagem, o texto afirma que o deus bíblico é apenas uma "lembrança de um outro tempo perdido na história". Apenas um exercício bobo de futurologia crental, sem mais o que acrescentar em termos de argumentos. Apenas bobagens de crente fundamentalista.

Na imagem seguinte, o crente define esse possível futuro como sendo "o império da razão" e o mostra como sendo um local escuro sob uma lua cheia. Isso diz muito sobre o pensamento de um fundamentalista. É uma inversão. Para um fundamentalista mais ferrenho, a razão realmente representa as trevas e a fé representa a luz. É justamente o contrário. O período histórico no qual a humanidade foi guiada pela fé ficou conhecido como Idade das Trevas, que só acabou quando a razão passou a ditar as regras, com o Iluminismo. Há um predomínio de imagens sombrias no vídeo para passar a ideia de que um futuro "mundo ateu" seria um "mundo escuro". Mais adiante, o texto continua insistindo na mentira de que existe uma "moral objetiva" e, o pior, seria advinda de um ser fictício. Como já demonstrei nos parágrafos anteriores, isso é uma mentira. A moral é construída através de valores seculares que também evoluem com a sociedade. Na verdade, a religião sequestrou a moral, tentando espalhar a mentira de que é uma exclusividade sua.

O texto toca no assunto do relativismo moral ao dizer que alguns "sentimentos que outrora eram vistos como inferiores e evitados, agora são aceitos em muitas situações e isso passa a ser visto de forma natural." Mais um show de mentiras. Aqui, talvez, o crente tenha querido se referir à homossexualidade, que em sociedades atrasadas era considerado crime e punido até mesmo com a morte, e hoje já é bastante tolerada. Mas o desavisado se esquece de que os próprios chefes do cristianismo tiveram que rever a sua posição diante da escravidão, mesmo com o "livro sagrado" apoiando-a. Isso prova que os cristãos também seguem um certo relativismo moral, caso contrário teriam que aceitar a escravidão como algo "normal", pois está lá, na bíblia, apoiada por figuras como Jesus e Paulo. E outra: muitos analfabetos funcionais confundem "natural" com "normal". Natural é o que está na natureza. Não é o homem que determina o que é "natural". Normal é o que é estabelecido como norma através de determinações prévias de determinada sociedade.

Mais adiante, o texto faz um espantalho sobre a seleção natural, o que não é de se admirar em se tratando de um texto escrito por um fundamentalista. Com criatividade de ficcionista distópico, o autor do texto molda uma sociedade futura ateísta com uma legislação baseada na seleção natural, uma caricatura bem exagerada. Parece ser um exercício infrutífero pensar em uma sociedade ateia sob a perspectiva de um fundamentalista. Hoje em dia temos sociedades cuja maioria da população é desprovida de crenças em divindades. A Suécia, por exemplo. Um país de primeiro mundo com mais de 80% da população que não está se importando muito com inutilidades como a fé religiosa. E daqui surge uma discussão interessante, pois os fanáticos costumam dizer que a Suécia tem altos índices de suicídio, mas se esquecem de dizer que o Brasil, com quase 95% da população formada por religiosos (a maioria, pessoas cristãs) possui altíssimos índices de criminalidade, com altas taxas de homicídio, latrocínio e outros.

A caricatura prossegue, dizendo que o homem desprovido de crenças em divindades vive com felicidade, mas a imagem que aparece é a de um palhaço chorando. Logo depois disso, o vídeo idiota termina de uma forma igualmente idiota, evocando a doutrina irracional do sacrifício, uma doutrina imbecil cultivada por povos primitivos, violentos e selvagens. Povos primitivos pensavam que derramando sangue, poderiam aplacar a ira dos deuses. O deus dos hebreus, então, teria mandado seu filho para morrer e apagar um erro imbecil que ele próprio teria cometido. Ou seja, nada inteligente para um deus perfeito. Mas essa é uma questão doutrinária interna dessa religião, muita gente considera plausível e nem vale a pena se estender nisso. Mas colocar uma doutrina estúpida como essa de "morte para salvar a humanidade" para fazer contraponto com uma sociedade racional é meio fora de propósito. Mas normal para um fundamentalista, tipo de gente que não prima muito pela inteligência.

Nenhum comentário:

Postar um comentário