quarta-feira, 28 de março de 2012

Em Questão: A Violabilidade da Urna Eletrônica



Um grupo de técnicos em informática conseguiu decifrar os códigos de proteção da urna eletrônica em testes encomendados pelo TSE. A notícia foi divulgada na última sexta-feira (23 de março de 2012) e pode ser conferida em detalhes no seguinte link:

http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2012/03/unb-diz-que-descobriu-fragilidade-na-seguranca-da-urna-eletronica.html

Desde que as urnas eletrônicas entraram em funcionamento no Brasil, eu sempre me mantive cético em relação a esses aparatos tecnológicos. Em primeiro lugar, se analisarmos o cenário político internacional, seria ingenuidade de nossa parte considerar que alemães, japoneses, suecos, estadunidenses etc. sejam idiotas e que saibam menos de informática do que nós, brasileiros. Nem a Alemanha, nem o Japão, nem os Estados Unidos e nem outro país de destaque no cenário internacional adotou o modelo da urna eletrônica. Por que, hem? A resposta mais plausível seria a de que nesses países as autoridades talvez não considerem que haja realmente a possibilidade de instaurar um sistema informatizado de votação que seja plenamente confiável no que diz respeito à questão da inviolabilidade.

Mas o que estaria acontecendo com a nossa urna eletrônica? Bem, para começar, toda essa conversa do TSE de que não é possível saber a ordem de votação dos eleitores nas diversas zonas eleitorais simplesmente não é verdade. Primeiro, há uma máquina que marca a ordem cronológica em que o eleitor chega. Quando o eleitor chega ao local de votação, há um mesário que aperta o botão para liberar a urna, e esse botão está ligado a essa urna por um fio. Essa ligação física permite saber a ordem em que cada eleitor votou, porque ela não segue uma ordem alfabética e sim cronológica. O eleitor chegou lá e vota, não interessa se o primeiro nome dele começa com A ou com Z. Ou seja, o mesário sabe a ordem em que eu votei, se eu fui o primeiro a votar naquela sessão, ou se fui o último ou qualquer outra ordem.

Os técnicos da UnB conseguiram quebrar o algoritmo, mas eles não têm a lista dos nomes dos eleitores. Mesmo assim, a lista não seria tão necessária. A partir do momento em que você desvenda a sequência lógica dos dados criptografados e também existe um fio que liga a urna à mesa, teremos, em consequência, a quebra do sigilo do voto. Isso é sério! O sigilo do voto do eleitor está seriamente ameaçado no Brasil. Quem pode garantir que quem quer que seja não esteja a par de como os brasileiros votam? Seria leviandade afirmar com precisão que aconteça fraudes. Mesmo porque isso é tecnicamente muito difícil de fazer. Mas de que é possível saber como o eleitor está votando, disso eu não tenho a menor dúvida. Em relação a isso eu não sou cético.

O sigilo do voto é uma questão fundamental, porque isso é uma proteção para o eleitor e para as instituições. Se não haver essa correlação entre voto e indivíduo, a opinião do indivíduo estará preservada. O eleitor é absolutamente livre para dar a opinião que ele quiser na hora do voto. Com a violação do sigilo, há a possibilidade de se fazer antecipações através de estudos apurados de como os brasileiros votam. Isso abre um precedente preocupante, pois já sabem quase tudo sobre o cidadão, e agora também podem saber como o cidadão vota. Isso abre uma possibilidade muito grande de controle da sociedade. Por isso o sigilo é importante. O sigilo do voto é muito importante para a democracia e para a sociedade, e a urna eletrônica (como ela atualmente se apresenta) nunca garantiu isso para nós.

Se há problemas sobre a questão da inviolabilidade do voto, como foi devidamente detectado pelos técnicos da UnB, é preciso urgentemente introduzir meios de evitar com que aconteça a violação do sigilo. Se, por um lado, a urna eletrônica nunca nos deu uma garantia plena de inviolabilidade do sigilo do voto, por outro, nem devemos pensar na possibilidade de retrocesso, de voltar aos tempos do voto no papel. Todos conhecemos a realidade brasileira. A apuração dos votos no papel cria dois impasses: torna viável a possiblidade da incorrência em fraudes e cria instabilidade política devido ao processo de demora na apuração. Outro perigo disso tudo é entrar na paranoia de imaginar um cenário distópico orwelliano, tiranizando a urna eletrônica como se ela fosse instrumento de um possível "Grande Irmão".

A incomensurável improbabilidade do conspiratório controle eletrônico da sociedade, porém, também não pode abrir um precedente para imaginarmos que NÃO HAJA conspirações. Se, por um lado, a posição de crédito total às teorias conspiratórias é ingênua, o posicionamento contrário é igualmente pueril. O que não falta nos bastidores do poder é conspiração (grandes reportagens esporadicamente veiculadas pelos meios de comunicação evidenciam isso). O que torna absurda a teoria da conspiração é atribuir TUDO às atitudes conspiratórias, como se fosse possível não existir situações que não sejam conspiratórias. Por que só agora estão provando que a urna realmente é violável? Por que isso não foi feito antes? Por que o TSE resistiu tanto tempo em colocar a urna à prova?

Que se criem mecanismos mais rígidos de segurança. Mas que esses novos mecanismos de segurança não passem necessariamente pela via do retrocesso. Voltar ao período do voto no papel seria uma derrota para a democracia. Mas que os eleitores também não se iludam com teorias conpiratórias tolas. Há uma ameaça ao sigilo? Sim, há. E ela deve ser encarada com a maior seriedade. Deve ser encarada sem apelo a medidas retrógradas e sem paranoias conspiracionistas. Tudo para o bem da democracia.

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